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  • Foto do escritorChristiane Wolf Suzuki

O tornar-se Professora na Universidade Leuphana em Lüneburg. Relato de Vânia Zuin Zeidler

Atualizado: 31 de mai. de 2023


Hoje, a Alemanha celebra o Dia da Diversidade e em nossa seção “Vozes da Comunidade” é a vez da Prof. Dr. Dr. Vânia G. Zuin Zeidler. Ela é Professora de Química de Recursos Orgânicos Renováveis no Instituto de Química Sustentável da Universidade Leuphana, Lüneburg, onde também atua como Pro-decana de gênero e diversidade da Faculdade de Sustentabilidade.


Seria mais um relato atravessado por um mar, de tantas quantas pesquisadoras e professoras que sentiram na carne as condições mínimas de existência e liberdade acadêmicas despencarem no Brasil nos últimos anos. Já era possível antever o que viria – recomendo a leitura do relatório do Observatório Pesquisa, Ciência e Liberdade da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência, da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), do Observatório do Conhecimento e do Centro de Análise da Liberdade e do Autoritarismo (LAUT), disponível em http://portal.sbpcnet.org.br/noticias/liberdade-academica-esta-em-risco-no-brasil/.


Me recordo de com minha filha Júlia, uma menina pré-adolescente à época – e que me acompanhava desde os 6 meses de idade em todos os eventos, inclusive científicos – nos sentarmos numa tarde sem vento em 17 de abril de 2016 para assistir à votação do impeachment ou golpe pelos deputados federais, que vociferavam as barbáries das barbáries quando tinham acesso ao microfone e palco dantesco. Júlia chorou naquele momento em frente à TV, num tempo distópico, sem pipoca. Após algumas horas ela saiu para brincar no quintal com gramado, árvores frutíferas, flores e sol. Para mim que a observava da janela, ficou apenas o gosto de sal. Depois desse dia, chorei muitas vezes.


Quanto tempo é necessário para se formar e se tornar uma pesquisadora? Quanto esforço pessoal principalmente, mas também institucional há nisso? E para manter? Formalmente posso dizer que minhas atividades científicas com e na Alemanha se iniciaram há quase duas décadas, como bolsista de pós-doutorado da Fundação Alexander von Humboldt, instituição que apoia pessoas, não projetos, por uma vida toda. Temos um mote: uma vez humboldtiana, sempre humboldtiana (https://www.humboldt-foundation.de/en/). Naquela altura em 2004, com Júlia bebê, quando ainda nem se falava em mãe-pesquisadora no Brasil e de políticas institucionais para o exercício parental, a Alemanha nos abraçou, e recebi todo o apoio e consideração para pesquisar no Helmholtz-Zentrum für Umweltforschung GmbH (UFZ, em Leipzig).


Na Alemanha talvez haja um traço cultural pautado na objetividade, franqueza e robustez das instituições democráticas que são normalmente estranhadas no Brasil, mas excelentes e necessárias para atuarmos de maneira mais adequada em relação às diferenças, semelhanças, potencialidades e, em meu caso, frentes de pesquisa na área de química para a sustentabilidade e diversidade. Para saber mais sobre ser pesquisadora e assuntos relacionados, por exemplo, recomendo o texto https://redeapoenaoficial.wixsite.com/website-1/post/ser-mulher-pesquisadora-na-alemanha, o vídeo https://www.youtube.com/watch?v=Cmcm4GgCXkA e uma visita ao website https://www.leuphana.de/en/institutions/faculty/sustainability/diversity.html.


Retornei ao Brasil ao final desse pós-doutorado, trabalhando de maneira superlativa não apenas na Universidade Federal de São Carlos (UFSCar), mas em outras instituições dos estados, principalmente de São Paulo, e federais, incluindo as de outros países, com destaque para o Centro de Excelência em Química Verde da Universidade de York, na Inglaterra, onde também fui professora visitante por cerca de 10 anos. Como humboldtiana recebi muitos colegas alemães no Brasil e participei de missões de pesquisa também na Alemanha. Em 2015 fui eleita presidente do clube Humboldt do Brasil e tinha como uma das missões divulgar os programas da fundação no país, por exemplo, com participação e organização de eventos abertos, como o “Brazilian Humboldt Kolleg 2016“ intitulado “Environments: technoscience and its relation to sustainability, ethics, aesthetics, health and the human future” http://www.avh.kollegbr.ufscar.br/, que gerou um livro homônimo (https://edufscar.com.br/exatas/environments-509600113).


Um ponto de virada se deu em março de 2020, uma odisseia. Recém-chegada em Lüneburg com Júlia, e estudantes que orientei e oriento de pós-graduação do Brasil, para atuar como professora visitante por um ano na Universidade Leuphana, nos vimos em meio à pandemia. Muitas atividades na Leuphana ocorriam também de forma presencial, seguindo os protocolos de segurança e saúde. Mesmo com as condições de excepcionalidade fizemos para além do esperado em termos de projetos e publicações envolvendo os dois países. Muitos romantizam a carreira acadêmica no exterior, especialmente Alemanha, como algo fácil; eu diria que é uma experiência muito mais exigente, mas ao mesmo tempo frutífera. Hoje a Alemanha é considerada um dos primeiros países em termos de liberdade acadêmica, que é mesmo uma política de estado. Para simplificar, aqui é também o lugar e tempo em que me realizo, me renomeio e me cora-coralino: sou uma química sustentável de renováveis, pois que procuro regenerar e recriar vidas, remover pedras e muros, plantar flores e frutas, fazer e distribuir doces. Aqui posso reinventar um poema “Aninha e suas pedras” científico.


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